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O adeus a Cezenildo, o amigo da Metropolitana

Ontem me ligou o Francelino, companheiro das lidas no Núcleo Bandeirante. Francelino, assim como Cezenildo, foi motorista da Administração Regional e hoje é dono de uma marmoraria ali na Placa da Mercedes, na subida para o Riacho Fundo. Francelino é daquele tipo de pessoa com o qual se pode contar em todas as horas. Calmo, comedido e amigo de todos com os quais convive.

Mas Francelino ligou para dizer que Cezenildo, o Careca, havia morrido na noite anterior e que o enterro seria na manhã seguinte, no Campo da Esperança. Morrera de um enfarto fulminante. Chegara a sua casa, estacionara o carro, acionara o freio de mão e morrera ainda com o cinto de segurança atado. Não houve sofrimento prolongado. Foi encontrado
ali, no banco do carro sem expressão de dor estampada.

Careca gostava de uma cerveja, conversar com os amigos, passar a noite na farra, mas era um homem de família. Tão família que a primeira esposa convivia tranquilamente com ele e com sua segunda esposa com a qual teve seis filhos além dos quatro do primeiro matrimônio. Mas o Careca gostava de uma farra, daquelas farras inocentes de passar a noite bebendo e conversando com os amigos. Talvez seja por isso que os chegados ouviram-no dizer por várias vezes que estava vivendo no lucro, pois tinha aproveitado a vida. Pode-se dizer que era um homem feliz e realizado, apesar das poucas posses.

Enquanto conversávamos, eu reparava no aspecto geral do Campo da Esperança. Trata-se de um dos poucos lugares onde foram mantidas as árvores originais do cerrado. Vi sucupiras, caviúnas, barus e várias outras tais que ali convivem com ciprestes e outras exóticas.

Algumas questões sociais afloraram da visita. A primeira é a questão da privatização do Campo da Esperança e dos demais cemitérios do DF. Quando a administração estava a cargo da Fundação das Pioneiras Sociais, ela o fazia sem fins lucrativos e oferecia seus serviços de modo gratuito àqueles que não podiam pagar. Parece-me não ser desejável que estes serviços fiquem nas mãos da ganância e do lucro, uma vez que o governo destinou as áreas e as equipou para tal fim. O sepultamento deve ser encarado como um serviço público e não como um comercio.

A outra questão é a opção pela cremação. O ex-Governador José Aparecido de Oliveira estabeleceu como um de seus projetos prioritários a instalação de um crematório no Distrito Federal para atender aqueles que preferem tal opção. Não posso precisar se o fracasso do projeto se deu por resistências ou por inépcia daqueles que foram encarregados de implementá-lo. O certo é que aqueles que preferem esta maneira de tratar os restos mortais, são obrigados a procurar os serviços fora do DF.

Por fim, vendo ali a família do Careca reunida em volta do sepulcro, a espera do término dos trabalhos dos pedreiros, veio a minha memória, a lembrança de um pai diante do corpo da filha, pedindo a presença de um Padre que ministrasse os últimos sacramentos e conduzisse a cerimônia, pois “ela neles acreditava e gostaria que assim fosse feito”. Creio ser necessário um ritual tanto na capela quanto ao lado da sepultura que ofereça conforto aos familiares naqueles momentos de dor.

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Sobre
Eustáquio Ferreira

Arquiteto pós-graduado em Administração, escritor e blogueiro.

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